sábado, 11 de agosto de 2007

Entrevista realizada por Júlio Garcia com Gustavo de Mello, ex-chefe da Casa Civil no governo Olívio Dutra:

'O modelo existente é oneroso, ineficaz e superado'


1-Blog: Como o Senhor, que integrou o governo Olívio Dutra como chefe adjunto e, após, Chefe da Casa Civil, avalia o processo de integração das polícias - civil e militar - tentado pelo governo da Frente Popular?

No governo da Frente Popular caminhamos na direção de um novo modelo de segurança pública – o modelo existente é oneroso, ineficaz e superado; esta era nossa opinião em 1999 – e procuramos alterar esta realidade no limite do ordenamento jurídico vigente com a formação integrada, o comando único, o novo estatuto da PM, o boletim único de ocorrência, a reestruturação administrativa da Polícia Civil e mais, as corregedorias fortes e integradas.

A ampliação do conceito de interinstitucionalidade também nos aproximou cotidianamente do Ministério Público e os resultados da Força Tarefa, para combater o crime organizado, foram muito estimulantes.

2-Blog: Quais as principais reações a essa iniciativa que surgiram durante esse período?

O processo de mudança sofreu muita resistência por parte das corporações da Segurança Pública (SUSEPE, BM, PC e IGP) e resistência enorme por parte de adversários políticos e da mídia tradicional que fez - e ainda faz - um debate muito empobrecido neste assunto. Reconhecemos que havia uma expectativa relacionada com defasagens históricas dos vencimentos e a necessidade de planos de carreira, fato que corrigimos em parte com as horas-extras para a BM, o Plano de Carreira do IGP e outras políticas nesta área. Claro que não era o ideal, mas o fato mais contundente foi aquele que conseguiu, diante destas dificuldades, carimbar as tentativas de mudança como partidarização, como coisa do PT e não como ações fundadas no interesse publico e na necessidade urgente de mudar; mesmo com todos os limites de financiamento.

3-Blog: Como o Sr. avalia essa experiência? Que dados positivos podem ser destacados?

Nós temos governos do PT como exemplo. A cidade de Diadema, em São Paulo, é uma prova da redução de homicídios por cem mil de forma muito radical, muito contundente e é algo para ser comemorado. Pois não é que ali se usaram os conceitos que começávamos a implementar por aqui, no Rio Grande do Sul, e os resultados começaram a aparecer quatro anos depois? Aqui, nossos adversários minaram politicamente o debate sério de temas importantes para promover as mudanças. A corrupção, por exemplo, tem que ser enfrentada com coragem. Eles trocaram esta vontade política da mudança necessária pela complacência do discurso vazio da “autoestima” e da “autonomia das corporações”. O resultado foi o “gatilho fácil” nestes últimos anos e a morte de muitos inocentes desnecessariamente. O governo Rigotto lavou as mãos e - publicamente - se escondeu sempre atrás de escalões inferiores de governo, quando tinha que prestar esclarecimentos públicos. A maioria dos órgãos de imprensa do estado protegeu e blindou o atual Governador e o Secretário de Segurança Publica, algo que se apresenta como um deboche da sociedade; algo que, no passado imediato, no nosso casso, sempre era imputado aos principais dirigentes da experiência petista de governo, como ocorreu com o então secretário José Paulo Bisol.

4- Blog: Na sua opinião, o que levou o governo Rigotto a encerrar essa política? Os problemas vivenciados hoje pela Segurança Pública no Estado, que se avolumaram nos últimos três anos, têm alguma coisa a ver com a paralisação da tentativa de integração das polícias, iniciada no governo que o Sr. integrou?


Ao contrário do que possa parecer, as corporações são muito politizadas e usam e abusam destas relações políticas para influir nos rumos da política pública. Só para ilustrar, tomo como exemplo a escolha de um comandante da BM: Ele havia sido ajudante de ordens de um ex-governador - agora deputado da base de apoio do atual governo - que era do mesmo partido do Secretario de Segurança do RS. Ele acabou escolhido para comandar a BM. Portanto, me parece que o critério técnico não era o mais importante, como ficou demonstrado. Só posso concluir que - de uma forma muito cínica - aqueles que acusaram a “partidarização” no governo passado, foram muito mais ardilosos e ainda mais partidários do que a sociedade possa perceber, e isto só podia acabar gerando mais descontrole e ineficiência.

O uso das promoções por merecimento – bem superior às promoções por antiguidade – é uma prova da proteção política que é dada a alguns indivíduos ligados aos partidos que apóiam o atual governo, com certeza.

A integração, por óbvio, sempre foi barrada pelas corporações que a sabotavam, mas havia uma vontade política do nosso governo em implementar esta política decisiva para combater a criminalidade. O governo Rigotto recuou porque sua estratégia era agradar os cardeais da Polícia Civil e os oficiais conservadores da Brigada Militar. Ele ganhou votos e se elegeu e depois cumpriu com sua promessa: acabou com a integração!

Lamentavelmente, o balanço é este: a sociedade ganhou mais mortos, mais vítimas e a sensação de que nada vai mudar e tudo vai ficando cada vez mais fora de controle do que qualquer um de nós podia imaginar. (Porto Alegre, 2006)

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